terça-feira, 10 de maio de 2011

Sobre como os ignorantes não sentiriam nada diante de um Monet



As 10h47
Ela é linda, tem seus 30 e poucos anos, mas não se aparenta. È bela e não se precisa de muito para fazer-se assim, mas ela insiste em passar dezenas de minutos na frente do espelho retocando a maquiagem, escolhendo a sua melhor roupa e o seu batom mais brilhante.

As 11h30
Esta pronta, e sua pequena filha também. Ela coloca a mochilinha nas costas de sua filha e ambas caminham para a escolinha. As calçadas não são passarelas e os transeuntes não são fotógrafos, mas o que isso importa, ela se sente bela, sensual e desejada.

As 12h11
Já esta de volta a casa. Desfaz-se toda a pintura, como se um removedor tivesse sido jogado em uma tela pintada por Monet.
O pó, o carpete manchado, a louça suja do almoço, a novela, a faxina e a ligação do marido durante o dia que nunca acontece é o removedor jogado em sua vida, borrando toda a sua beleza e revelando toda a sua solidão.

As 17h43
O conformismo e a espera. Volta á frente do espelho, escolhe a sua melhor roupa, enfeita com um novo penteado o seu cabelo e já esta pronta para buscar a sua filha. Algumas mulheres fazem comentários invejosos sobre ela, alguns homens fazem comentários libidinosos sobre ela, outros ainda sentem-se tentados a possui-la, porém ela pensa consigo mesma: “Pertenço apenas a um homem, e a ele sou devotado”.

As 18h29
O fogão a chama. As verduras, as carnes ensangüentadas e as panelas fazem brotar de sua pele antes tão macia e perfumada o suor imaculado e salgado. Correndo contra o tempo ela se banha, colhe as roupas do varal, escolhe o seu melhor vestido, passa a sua melhor colônia, a de jasmins, coloca a filha na cama e conta uma história até ela adormecer, arruma os pratos na mesa e aguarda zapeando a tv o seu marido.

As 21h47
O barulho do molho de chaves tilintando atrás da porta anuncia a chegada do seu amado, que com um beijo mal dado em sua face se joga no sofá e avisa que não irá jantar porque bebeu e comeu petiscos no bar com seus amigos. Sentada sozinha a mesa ela inicia uma conversa. Fala sobre seu dia, sobre as travessuras de sua filhinha, mas logo é interrompida pelo roncar estridente que ecoa da sala.

As 22h10
Ela lava a pouca louça do jantar e guarda o que sobrou no refrigerador. Descalça o seu homem e desabotoa a sua camisa. Com algum esforço o ajuda a chegar na cama e lhe da um beijo carinhoso no rosto desejando uma boa noite.
Pouco tempo depois retira suavemente o seu vestido, sua mão desliza suavemente pelos contornos de seu corpo, por minutos ela observa o seu fronte nu em frente ao espelho, procura falhas, mas não encontra, ninguém encontraria.

As 22h31
Deita o seu corpo cansado ao lado do corpo inerte e esboça um sorriso, imaginado que no amanhã, dentro da sua rotina terá uma nova chance de fazer-se útil e querida a todos. E mais uma vez buscará forças para viver. Viver?

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